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Queria saber desenhar...

Para ilustrar essa estória... com giz de cera.

Era uma vez, uma menina. Ela usava um par de chiquinhas, presas com fita azul, aquele, azul muito forte, celeste. O cabelo era bem repartido no meio, e bem preso. As chiquinhas ficavam no alto. O cabelo da menina era vermelho, bem vermelho. E ela tinha sardas sobre o nariz. E um par de olhinhos negros. E tristes.
Ficava sempre na janela, a espiar, pelo canto de uma cortina, cheia de flores de papel. Ela cortava as flores, amarrava, todos os dias, em fios de costura verde.
Calma e concentrada, grave até. Como se o equilíbrio do mundo dependesse daquilo.
A menina era séria, nunca abria o vidro. Seus lábios, pequenos, tinham poucos sorrisos a repartir.

Um dia, intrigada com a alquimia do mundo, suspirou. Todas as dores de seu coração antigo. E teve uma idéia.
Foi a cozinha. E suspirou, cheia de dores. Uma vez, e outra, e outra, e outra. Era tanto ar que poderia voar. Mas suspirou em uma tigela, a tigela das claras em neve.
Ela fazia suspiros, com toda a sua força de menina.
Misturou açucar colorido.
Tingiu as claras, grave, ainda.
E olhava o forno.
Não tirou os olhos de lá, como quando estava na janela.

Quando os suspiros ficaram prontos, com suas cores, sua leveza e seu doce, a menina saiu. Levando todas numa cesta, com guardanapos de bolinhas.
E distribuiu os suspiros, para todo par de olhos tristes como os seus.

Mas os seus passos foram seguidos pelo vizinho. Que era um menino gordinho, muito louro e vermelho. Ele não tinha olhos tristes, mas rodopiava em torno da menina.
Gritou:
- Eu quero!
Era daquelas pessoas que nunca cessam a sua fome.
Tomou-lhe a cesta, derramandos os últimos suspiros.
Na briga, sem querer, ou de propósito, ou por azar, pisou-lhe os frágeis açucares coloridos.

A menina encheu seus olhos d'agua.
De que adiantava dividir-se, se o que recebia de volta era mais tristeza?

Mas o vento soprou em sua volta, aos borbotões. Milhares de farelinhos coloridos.

Agora, a menina abre a janela e fecha os olhos.
O vento beija-lhe as faces
O vento doce, que carregou os últimos suspiros.

Comentários

  1. lendo essa história acabei me lembrando de uma história que vinha num livro didático do ensino fundamental. O nome era " o coração de corali". Corali vivia sempre triste, suspirando... nada era possivel fazer para que fosse preenchido o coração de corali.
    Que ao olharmos no espelho, nenhuma de nós vejamos refletido nele o coração vazio de corali.

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