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Texto para Enki.


Fui à biblioteca do lugar onde trabalho, hoje. Eu evito ir até lá, pois, a contrariar com o estigma das bibliotecas, eu acho que esta é muito barulhenta. Um burburinho enxameado (já contei que tem um livro me fazendo perdoar as abelhas?) permeado por mais burburinho, numa espécie de looping infinito ecoando pelas paredes.
É engraçado que no prédio antigo a biblioteca era uma bolha de silêncio e concentração. Eu SEMPRE fugia para lá. Mas nessa, não funciona assim, então, eu fujo para as árvores, ou para minha sala.
Mas, hoje ao ir para lá, ela me recebeu com mais silêncio do que das outras vezes.
Lembrei, portanto, o quanto eu gosto das bibliotecas e fiquei por lá, acarinhando as paredes e mantendo contato com todos aqueles livros juntos.
Gosto de visitar bibliotecas com o espírito de exploração, como quando fazemos visitas as livrarias. Tiro os livros inimagináveis das estantes, olho os índices, folheio. Amigos em potencial, é o que são, a espera que alguém os veja e dialogue com eles.
O bibliotecário me interrompeu:
Precisa de ajuda? Qual livro a senhora está procurando?
Eu até tinha ido procurar um livro, mas... Estava sorvendo aparência, e queria achar o livro sozinha. (Sinto uma emoção ao encontrar sozinha o livro, mais ainda se eu não peguei o “endereço”dele, e encontro só ao passear pelas estantes)
Eu agradeci, disse que já tinha achado a estante que eu queria. (A de teoria de história) e fiquei lá como quem visita amigos antigos – entre mudanças conheço o acervo dessa biblioteca a uns 8 anos.
Impliquei, com rabugice, com os novos moldes de classificação, ainda que me fizessem achar mais livros novos.
Sentei ao chão, para ver melhor.
Tenho uma teoria de que os livros mais legais estão nas estantes mais inacessíveis.
Passou um moço, de uma estante vizinha, e perguntou se eu queria ajuda.
Deve ter achado estranho a moça sentada como um índio no chão do corredor.
Senti os olhos do bibliotecário por perto.
Agradeci, peguei o livro que queria – é fácil, quando se conhece a lógica das estantes, no fim.
Fui embora, depois de conversar um pouco com outro bibliotecário, amigo antigo.
Pensei em como está errada a nossa relação com o conhecimento. Afinal, aprendemos mais na net, por que nada nos impede de passear livremente. Na biblioteca, o formalismo faz com que o atendimento pareça o de uma farmácia. Livros herméticos. Você deve saber exatamente o que precisa. Não há tempo para interagir com o acervo, como se fosse uma espécie de falta de respeito.
Como se eu pudesse fazer amizade só com os livros que guardo em casa.
Ainda acho que os da biblioteca tem mais histórias para contar. Pq pouca gente escuta.

Enki é um dos muitos deuses do conhecimento.

Comentários

  1. Também adoro explorar bibliotecas, de ficar passeando pelas prateleiras e ver todos aqueles livros juntos ao alcance da mão e dos olhos..."Amigos em potencial", como vc disse! A biblioteca do lugar onde estudo também é estranhamente barulhenta...é estranho que o pessoal vai lá ou pra conversar nas mesas ou pra dormir nos sofázinhos ¬¬. Mas é uma boa biblioteca, cheia de histórias pra contar e cheia de amigos em potencial... =)

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  2. Acho muito bonita a relação de uma pessoa com um livro ou biblioteca. Não só poético ou sei lá...trancendental?!
    Gostaria de ter essa relação,talvez apaixonada ou espiritual. Mas livros sempre foram para mim como um inimigo. Prefiro ficar sem fazer nada à ler. Mas enfim, sou obrigado a lê-los constantemente, por pura obrigação e tédio. Eles servem mais como uma ferramenta, ou talvez, uma maneira para ficar ocupado e não pensar na vida...
    Desde criança tenho um pesadelo bem peculiar: sonho que estou numa biblioteca gigantesca, com pouca iluminação, ando pelos corredores a procura de um livro que não sei. Após uma eternidade, encontro-o numa estante. Mas quando pego nas mãos, não consigo enxergar as letras.As folhas estão em branco. Fico aflito e começo a suar como um louco. Daí acordo.
    Pesadelo bem bobo...

    Mas acho linda a sua relação com os livros...

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  3. Segunda fui na biblioteca e tinha uma moça fazendo EXATAMENTE a mesma coisa que você. E, veja só, era a estante da história, devia ser perto da teoria da história. Levei o livro pra fazer amizade com ele no ônibus. Aprendi a ler no ônibus. Nada que um Dramim B6 não resolva.

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  4. Faz tanto tempo que não "flano" em uma biblioteca... Comecei de pequeno na biblioteca municipal, até hoje vou lá visitar nas férias. Na inauguração do prédio definitivo, nos anos 50, esteve meu primeiro orientandor, o José Roberto do Amaral Lapa. Ói: http://www.dape.com.br/araras/Pages/bibli.htm

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